sábado, 13 de fevereiro de 2010

A 1ª vez

Lisboa , 20 de Fevereiro

Querida Marta,

São quatro e meia da manhã. Hoje apanhei o maior susto da minha vida. Quando cheguei a tua casa, encontrei o Diogo no pior estado que se possa imaginar. Tinha levado uma tareia de uns a quem deve dinheiro e estava tão em baixo que quase não conseguia falar. Por pouco não entrei em pânico. A tua mãe estava em casa de uma amiga e eu não sabia o que fazer. Pus-lhe uns pachos de água gelada sobre a testa e o olho esmurrado, mas ele continuava com dores. Foi então que me pediu por tudo que lhe fosse arranjar uma dose. Transpirava por todos os poros e tremia que até fazia impressão. Telefonei à Rita e, meia hora depois, ela apareceu com pó. Como nem o Diogo nem eu tínhamos dinheiro, vim cá a casa buscar três relógios e levei-os para a Rita ver se podia pagar com aquilo. Depois, pedi, implorei à Rita que ficasse ali connosco, mas ela teve de sair e eu fiquei sozinha com o Diogo no quarto. Ele pediu-me tanto para eu não o deixar que fiquei ali parada, sem coragem para mexer um músculo sequer enquanto ele metia aquela porcaria. Os olhos dele estavam completamente vazios, pareciam olhos de cego. Depois, pouco a pouco, foi recuperando e sentiu-se aliviado, já nem lhe doía a cara da tareia nem nada. Fiquei espantada com aquilo. Nem queria acreditar! Então, num momento completamente louco, desvairada, passei-me da cabeça e pedi-lhe para experimentar um bocado, só para ver que efeito aquilo tinha. Ele disse que precisava da dose inteira, mas que, como era para mim, fazia o sacrifício.
Não me lembro do que pensei. Só sei que me senti noutro lugar. Era como se apenas o meu corpo estivesse ali e eu pudesse vê-lo longe. Não foi tão mau como eu imaginava. Por momentos, serviu-me para aguentar aquele mau bocado ao lado do Diogo.
Fico apavorada só de pensar que o meu pai pode vir a descobrir. Mas, com alguma sorte, distraído como ele é, não vai dar por nada. Pelo sim pelo não, desde que cheguei a casa não saí do quarto nem para jantar. Quando percebi que já toda a gente tinha ido para a cama, saí pé ante pé e fui levar o Lucas à rua, porque ninguém nesta casa faz isso por mim.
Fui ver-me ao espelho. Os meus olhos estão um bocado esquisitos, mas se calhar é só impressão minha. Amanhã já estou normal outra vez, espero! Amanhã não quero lembrar-me de nada. Vou fazer de conta que foi mais um pesadelo. Até porque foi mesmo...
Um beijo da
Joana

"Lua de Joana"
Maria Teresa Maia Gonzalez

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